Longe da vida, ao sol e à chuva, no quintal,
mora à beira de um poço a velha tartaruga.
Não raro, espia o azul, quando é tempo estival,
e faz, de junto ao poço, uma pequena fuga.
Chata, vai amassando o espesso capinzal;
feia, não tem na cara uma fenda ou uma ruga;
e é uma telha ambulante, encouraçada e oval
que a nojenta epiderme ao sol ardente enxuga.
Contudo, existe aí, dentro dessa incorreta
forma, dessa carcassa encarquilhada e fria
uma alma boa, uma alma humilde de poeta.
Mora dentro de mim algo desse quelônio:
negou-me a natureza encantos; todavia,
trago em mim a alma ingênua e pura de um campônio.
(Belo Horizonte, 1944. Um soneto alexandrinho fascinante de um poeta, com alma simples quelônio, a que temos um pouco, ou devemos ter na simplicidade campesina.)